Avances en Psicología Latinoamericana
ISSN:1794-4724 | eISSN:2145-4515

Koppitz’s Emotional Indicators and the Human Figure Drawing: A Comparison Between a Clinical and a School Sample*

Indicadores emocionales de Koppitz en el dibujo de la figura humana: comparación entre una muestra clínica y escolares

Koppitz’s Emotional Indicators and the Human Figure Drawing: A Comparison Between a Clinical and a School Sample

Helena Rinaldi Rosa, Gabriel Okawa Belizario, Irai Cristina Boccato Alves, Maria Luísa Louro de Castro Valente

Koppitz’s Emotional Indicators and the Human Figure Drawing: A Comparison Between a Clinical and a School Sample*

Avances en Psicología Latinoamericana, vol. 37, núm. 2, 2019

Universidad del Rosario

Helena Rinaldi Rosa

Universidade de São Paulo, Brasil


Gabriel Okawa Belizario

Universidade de São Paulo, Brasil


Irai Cristina Boccato Alves

Universidade de São Paulo, Brasil


Maria Luísa Louro de Castro Valente

Universidad Estatal Paulista, Brasil


Recepção: 11 Abril 2018

Aprovação: 21 Novembro 2018

Informação adicional

Para citar este artigo: Rosa, H. R., Belizario, G. O., Alves, I. C. B., & de Castro Valente, M. L. L. (2019). Indicadores emocionais de Koppitz no desenho da figura humana: comparação entre uma amostra clínica e escolares. Avances en Psicología Latinoamericana, 37(2). 195-204. Doi: https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.5118

Resumo: Um dos instrumentos mais empregados na avaliação psicológica infantil é o Desenho da Figura Humana (DFH), que possui diversos sistemas de pontuação, sendo um dos mais utilizados internacionalmente o de Koppitz, no qual é verificada a presença de Indicadores Maturacionais para avaliação do desenvolvimento da criança, e de Indicadores Emocionais, para determinar comprometimentos nessa área. Uma revisão da literatura indicou que, embora muitos estudos tenham sido feitos com o DFH, existe controvérsia a respeito desses indicadores. O uso dessa técnica justifica a relevância dessa pesquisa. A presente pesquisa investigou os itens propostos por Koppitz para avaliação de dificuldades emocionais, comparando uma amostra de 74 crianças, na faixa etária de 6 a 11 anos, que buscaram atendimento psicológico com queixas diversas, com um grupo controle de 74 escolares pareados por idade, sexo e tipo de escola, sem queixas emocionais. A aplicação foi individual e ocorreu nas clínicas de atendimento para o primeiro grupo e nas escolas para o grupo controle. Os resultados indicaram que os Indicadores Emocionais diferenciaram as crianças com dificuldades emocionais, que em geral têm seus desenhos afetados por tais dificuldades, contribuindo para confirmar a validade do DFH para avaliação emocional no Brasil.

Palavras-chave avaliação psicológica, desenho de figuras humanas, indicadores maturacionais de Koppitz, indicadores emocionais de Koppitz.

Resumen: Uno de los instrumentos más empleados en la evaluación psicológica infantil es el dibujo de la figura humana (DFH), que posee diversos sistemas de puntuación, uno de los más utilizados internacionalmente es el de Koppitz, en el cual es verificada la presencia de indicadores de maduración para la evaluación del desarrollo del niño, y de indicadores emocionales para determinar compromisos en esa área. Una revisión de la literatura indicó que aunque muchos estudios se han hecho con el DFH, hay controversia sobre estos indicadores. El uso de esta técnica justifica la relevancia de esta investigación. El presente estudio investigó los ítems propuestos por Koppitz para la evaluación de dificultades emocionales comparando una muestra de 74 niños en el rango de edad de 6 a 11 años, que buscaron atención psicológica con quejas diversas, con un grupo de control de 74 escolares emparejados por edad, sexo y tipo de escuela, sin quejas emocionales. La aplicación fue individual y ocurrió en las clínicas de atendimiento para el primer grupo y en las escuelas para el grupo control. Los resultados mostraron que los indicadores emocionales diferenciaron a los niños con dificultades emocionales, que en general tienen sus dibujos afectados por ellas, lo que contribuyó en la confirmación de la validez del DFH para evaluación emocional en Brasil.

Palabras clave: evaluación psicológica, dibujo de figuras humanas, indicadores de maduración de Koppitz, indicadores emocionales de Koppitz.

Abstract: One of the instruments most used in the psychological evaluation of children is the Human Figure Drawing (HFD), which has several scoring systems. The Koppitz Developmental Scale is one of the most known and used worldwide, in which the presence of maturational indicators for the evaluation of the child’s development and of emotional indicators is verified to determine impairments in this area. A review of the literature has indicated that although many studies used the HFD, there is controversy regarding these indicators. The use of this technique justifies the relevance of this research. The objective of the current research was to investigate the items proposed by Koppitz, which aim at assessing emotional difficulties, by comparing a group of children who sought psychological counseling to a control group without mental complaints. The sample was of 74 children aged 6 to 11 years, who sought psychological treatment with various complaints, and a control group of 74 students matched by age, sex and type of school without emotional challenges. The application was individual and occurred in the care clinics for the first group and in the schools for the control group. The results signified that emotional indicators help to distinguish children with emotional problems; in general, their drawings were affected by these difficulties, which contributes to confirm the validity of HFD for psychological evaluation in Brazil.

Keywords: Psychological assessment, human-figure drawing, maturational indicators by Koppitz, emotional indicators by Koppitz.

O Desenho da Figura Humana (DFH) é um dos testes psicológicos mais usados na avaliação psicológica infantil nos diferentes países (Wechsler, 2003), pois requer apenas lápis e papel, é de baixo custo e também é bem aceito pela criança. Este trabalho pretendeu estudar o DFH, para avaliar as dificuldades emocionais de crianças, refletidas em seus desenhos, uma vez que elas afetam as características do desenho em relação ao desenvolvimento intelectual, tendo como base a relação existente entre o desenvolvimento do grafismo e o cognitivo, bem como a relação entre a avaliação intelectual e emocional.

Existem diversos sistemas de avaliação do DFH (Domingues, Alves, Rosa & Sargiani, 2012), sendo um dos mais conhecidos e utilizados internacionalmente o proposto por Koppitz (1973) 1, que solicita apenas um desenho, para determinar a presença de Indicadores Maturacionais (IM) e de Indicadores Emocionais (IE), com 30 itens para cada uma dessas escalas. No Brasil também tem sido empregado o DFH-III (Wechsler, 2003) para a avaliação cognitiva, que solicita dois desenhos, um do homem e outro da mulher.

Várias razões justificam o uso de um sistema de pontuação quantitativo para o DFH em uma avaliação psicológica: a estimativa do desenvolvimento da criança; por ser menos influenciado pelas capacidades linguísticas; ser de fácil acesso e baixo custo, bem como por poder ser aplicado de forma individual ou coletiva. Assim, fornece informações complementares aos resultados de outros testes, permitindo também a interpretação projetiva dos desenhos.

Diversas pesquisas têm sido realizadas com os IES e IMS de Koppitz, tanto no Brasil como no exterior, seja de normatização e validação (Hutz & Antoniazzi, 1995; Rosa, 2006, 2008, no Brasil; Vélez-van-Meerbeke et al., 2011, em Bogotá), seja de sua aplicação nas áreas da saúde, da educação, junto a crianças institucionalizadas ou vítimas de violência, entre outros. Tem havido maior concordância no que se refere ao caráter evolutivo do DFH do que quanto aos IES. A tese de doutorado de Kobayashi (2015), defendida recentemente na Universidade de São Paulo, estabeleceu normas para os IES na mesma amostra empregada por Rosa (2006), segundo os critérios originais propostos por Koppitz (frequência do item deve ser menor do que 16% em cada idade na população geral). Entretanto, não estudou amostras clínicas, que estão sendo investigadas nesta pesquisa. Baseando-se nos resultados apresentados por Kobayashi (2015), neste trabalho os IES foram pontuados de acordo com os dados obtidos por ela, sobre a frequência em cada idade.

Em pesquisa brasileira anterior, Hutz e Antoniazzi (1995) estabeleceram normas para os dois tipos de indicadores de Koppitz em uma amostra de 1586 crianças de escolas públicas, que em geral eram de nível socioeconômico médio-baixo ou baixo, com idades entre 5 e 15 anos, de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Os autores apresentaram as frequências de cada item dos IMS e IES e percentis por faixa etária.

Tanto os IMS quanto os IES do DFH têm sido bastante utilizados em diversas pesquisas, como por exemplo, na predição do desempenho escolar, na diferenciação entre amostras clínicas, constatando ora a validade dos IES, ora pouca sensibilidade dos mesmos, como nos trabalhos de Cariola (2006), Bragheto (2008), Neme, Pereira, Rodrigues, Valle e Melchiori (2009), e de Castro e Moreno -Jiménez (2010), entre outras pesquisas no Brasil e no exterior.

Em Bogotá, na Colômbia, foi desenvolvido um estudo normativo por Vélez-van-Meerbeke et al. (2011), que revisaram 2420 desenhos de crianças da base de dados de um estudo transversal, realizado anteriormente para avaliar a prevalência de doenças neuropediátricas, com a finalidade de validar os IMS e os IES do sistema de Koppitz para o DFH. Propuseram tabelas adequadas para a população estudada, uma vez que constataram diferenças em relação às tabelas americanas de Koppitz, reforçando a importância da influência dos fatores étnicos e culturais nos itens do DFH e da obtenção de normas locais para o estabelecimento de diferenças em seu país.

Wechsler, Prado, Oliveira e Mazzarino (2011) pesquisaram as variáveis que afetam a prevalência de indicadores emocionais no DFH, numa amostra de 1103 crianças de cinco a 11 anos, sendo 695 meninas e 408 meninos, que não apresentavam distúrbios clínicos. Os desenhos foram avaliados por dois sistemas: o proposto por Naglieri, Mc-Neish e Bardos (1991) para avaliação emocional e o de Wechsler (2003), DFH-III, para avaliação cognitiva. A análise de variância mostrou a influência do sexo da criança, da idade, do tipo da figura desenhada, do tipo de escola e da interação entre sexo, idade e tipo de figura tanto na pontuação emocional quanto na cognitiva. A pontuação emocional teve correlação negativa com a cognitiva (p < 0.01), sendo -0.23 na figura masculina, -0.19 na figura feminina, -0.28 entre total de indicadores emocionais e cognitivos para as duas figuras. Foram recomendados distintos pontos de corte para subsidiar a avaliação psicológica infantil.

Souza e Hoffmann (2013) avaliaram 56 crianças (8 a 12 anos) com queixa de dificuldade de aprendizagem pelo DFH-III de Wechsler (2003 desempenho cognitivo) e pelos IES de Koppitz e encontraram metade (54.3%) com desempenho abaixo da média e 65.6% com indicadores emocionais. Das 25 crianças que apresentaram baixo desempenho cognitivo, 21 delas também apresentaram indicadores emocionais, confirmando dados da literatura, que apontam que as dificuldades de aprendizagem quase sempre estão associadas a comprometimentos emocionais.

A aplicação na área da saúde é uma das mais relevantes. Exemplo desses trabalhos é o de Kitamura, Delvan, Schlösser e Lançoni (2013), que investigaram a relação entre sintomatologia depressiva e obesidade em oito crianças diagnosticadas como obesas, quatro de cada sexo, com idades de 7 anos e 9 meses a 11 anos e 6 meses. Os instrumentos empregados foram uma anamnese com os pais, o CDI – Inventário de Depressão Infantil e o DFH. Os resultados indicaram que apenas uma das crianças obesas apresentou um total de indicadores de depressão acima do ponto de corte, entretanto, sete apresentaram dois ou mais IES em seus desenhos.

Özer (2010), na Turquia, comparou uma amostra clínica de 44 crianças com uma amostra não clínica, proveniente de escolas de 44 crianças emparelhadas com a amostra clínica. A análise de variância não mostrou diferenças significantes no número de IES entre os dois grupos e a classificação correta das crianças do grupo clínico em relação à presença dos IES ocorreu apenas em 56% dos casos.

Em 2006, Cariola avaliou os DFH de 22 crianças com diagnóstico de bruxismo, com idades entre 5 e 12 anos. Constatou que, entre as crianças portadoras desse quadro, 63.7% apresentaram dois ou mais Indicadores Emocionais, indicando a existência de conflitos emocionais.

Da mesma maneira, em relação às crianças vitimizadas e/ou institucionalizadas, os dados divergem, pois enquanto Zortéa, Kreutz e Johann (2008) encontraram pouca diferenciação entre crianças institucionalizadas e não institucionalizadas, Fiamenghi Jr., Melani & Carvalho (2012) indicaram a necessidade de mais pesquisas. Os primeiros justificam seus resultados pela qualidade do atendimento oferecido às crianças institucionalizadas e à pouca atenção e tipo de cuidados oferecidos às crianças não institucionalizadas. O primeiro grupo frequentava instituições em que havia uma rotina de atividades ligadas à faixa etária e atendimento psicológico, fonoaudiólogo e dentário, enquanto o segundo era proveniente de uma escola, que atendia uma população em situação econômica desfavorável. Os autores do segundo estudo constataram que as crianças mostraram diversos comportamentos de desajustamento emocional, relacionados ao Transtorno de Apego Reativo, embora a amostra tenha sido composta por apenas 25 crianças institucionalizadas e os autores não tenham apresentado quantitativamente os totais de IES obtidos pelas crianças, mas apenas as interpretações das avaliações. Sugerem a necessidade de mais pesquisas, ainda que tenham encontrado resultados favoráveis aos IES do DFH.

Santos, Ribeiro, Ukita, Pereira, Duarte e Custódio (2010) também compararam as características psicológicas de crianças institucionalizadas e não institucionalizadas que viviam com suas famílias. Cada grupo foi composto por 36 crianças, de ambos os sexos, com idades entre 5 e 10 anos. Os resultados do DFH mostraram diferenças significantes em relação ao total de Indicadores Emocionais, sendo que as crianças institucionalizadas apresentaram em média dois indicadores a mais do que as crianças que viviam com suas famílias.

Em relação às vítimas de violência, Hernandez et al. (2000) encontraram resultados favoráveis para os IES do DFH de Koppitz, em especial quanto à omissão das mãos, assim como Vasquez e Chang (2003), no Peru, que investigaram quais IES de Koppitz caracterizam crianças que sofreram maus tratos (físico, emocional ou psicológico, ataque sexual e abandono) em relação às crianças que não sofreram. Aplicaram o DFH coletivamente, nos albergues tutelares ou num centro educacional estatal, em 60 crianças, sendo 30 (8 do sexo masculino e 22 do feminino) que se encontravam internadas em albergues tutelares de Lima (Peru) por causa de maus tratos, e 30 crianças aparentemente sadias (11 do sexo masculino e 19 do feminino) de um centro educacional. As crianças vítimas de maus tratos apresentaram diferenças significantes para oito IES, com maior número de indicadores (transparência; braços curtos; presença de genitais; nuvens, neve, chuva e/ou pássaros voando; omissão da boca; omissão dos braços; omissão dos pés e omissão do pescoço). Essas diferenças eram relativas à impulsividade (transparência e omissão do pescoço); à insegurança e sentimentos de inadequação (omissão dos braços e omissão dos pés); à ansiedade (nuvens, chuva, neve e/ou pássaros voando); à timidez (figura pequena, braços curtos e omissão da boca); à agressividade (presença dos genitais); ao roubo (transparência, omissão dos braços e omissão do pescoço); e mau desempenho escolar (figura pequena, omissão da boca e omissão dos braços). Esse estudo corrobora a hipótese de que o DFH é um teste útil para uma avaliação rápida de perturbação emocional nas crianças.

Foram apresentados apenas alguns dos estudos mais recentes encontrados, uma vez que a bibliografia com o DFH é muito ampla, sendo um dos instrumentos psicológicos mais antigos e mais empregados na prática profissional e nas pesquisas com crianças. O objetivo deste artigo foi verificar a existência de diferenças entre um grupo de crianças com problemas emocionais que foram atendidas em clínicas-escolas ou em consultórios particulares com um grupo de crianças provenientes de escolas sem queixas de problemas emocionais nos IMS e IES de Koppitz (1973), bem como determinar a correlação entre os resultados dos dois tipos de indicadores no DFH.

Método

Participantes

Foram estudadas 148 crianças, sendo 74 de uma amostra clínica e 74 crianças de uma amostra de controle, sendo que a descrição da amostra por idade, sexo e tipo de escola dos grupos Clínico e de Controle é apresentada na tabela 1. A amostra clínica se refere a crianças atendidas em clínicas-escolas ou em consultórios particulares, cujos psicólogos e pais aceitaram a participação de seus filhos na pesquisa, que apresentavam diversas queixas psicológicas (dificuldades escolares, medos e ansiedade, queixas somáticas, problemas de comportamento, agitação, timidez e retraimento, entre outras).

A amostra do grupo controle foi composta por 74 crianças emparelhadas em idade, sexo e tipo de escola com as crianças do primeiro grupo, com a escolaridade compatível com a sua idade (ou seja, frequentando a série escolar esperada para sua idade cronológica – alunos com reprovação foram retirados da amostra controle) e que não apresentavam queixas clínicas psicológicas segundo os professores e a coordenação das escolas. O tipo de escola foi o indicador empregado para avaliar o nível socioeconômico das famílias uma vez que, no Brasil, as escolas públicas são frequentadas pelas classes sociais menos favorecidas e as particulares, pelas classes sociais de maior poder aquisitivo.

A faixa etária das crianças de ambos os grupos foi de 6 a 11 anos. Foram obtidos os desenhos de crianças, cujos pais ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (documento de autorização para a participação dos filhos na pesquisa, assinado pelos responsáveis e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos), em quatro escolas públicas e duas escolas particulares da rede oficial de ensino da grande São Paulo. Para comparar as duas amostras foi realizado o teste de Levene, que indicou que as amostras podem ser consideradas equivalentes, ainda que as condições reais de coleta não favoreçam o número exato de participantes em cada idade, sexo e tipo de escola.

Tabela 1
Distribuição de frequência da amostra total por sexo, idade e tipo de escola dos Grupos Controle e Clínico
Distribuição de
frequência da amostra total por sexo, idade e tipo de escola dos Grupos
Controle e Clínico


Material

Teste do Desenho da Figura Humana: folhas de papel sulfite branco (A-4), lápis preto nº 2, borracha. Foi solicitado às crianças, individualmente, que fizessem um desenho de um homem, completo (inteiro), e em seguida, o de uma mulher, também completa. A realização dos dois desenhos, de ambos os sexos, objetivou comparar os resultados para as duas figuras.

Procedimento

Nas escolas, a aplicação dos DFH foi feita de forma lúdica, respeitando o desejo de cada criança de executar a tarefa, fora dos horários da saída ou entrada na escola e sem perder aulas do seu interesse. A atividade foi bem-aceita pelas crianças, que inclusive solicitavam ser chamadas, mesmo quando não podiam participar. Foram excluídos os desenhos de crianças que a coordenação da escola indicava apresentarem alguma queixa emocional. Nas clínicas, a aplicação ocorreu segundo os mesmos critérios e de acordo com a conveniência também da(o) psicóloga(o), com consentimento dos responsáveis e sem prejuízo das atividades. Todos os desenhos foram pontuados quanto aos IMS e os IES propostos por Koppitz (1973). Uma das pesquisadoras foi a avaliadora em todos os casos.

Resultados

A tabela 2 indica as médias, desvios padrão e o teste t de Student entre as médias de pontos de IMS de Koppitz entre os dois grupos.

Tabela 2
Médias, desvios padrão e testes t das diferenças dos Indicadores Maturacionais de Koppitz entre grupo clínico e controle
Médias, desvios padrão e
testes t das diferenças dos Indicadores Maturacionais
de Koppitz entre grupo clínico e controle


É possível observar que ocorreram diferenças significantes entre as médias dos dois grupos tanto para a figura do Homem (p = 0.005), quanto para a da Mulher (p < 0.001), com médias menores para o grupo clínico e com resultados mais elevados para o grupo de controle. Esse resultado sugere que as crianças do grupo clínico têm mais prejuízos no desenvolvimento cognitivo.

A tabela 3 apresenta a comparação entre as médias dos grupos na pontuação dos IES. Por esta Tabela, pode-se perceber que ocorreram diferenças significantes entre as médias de pontos de IES dos dois grupos, para as duas figuras. Koppitz (1973) constatou que, para diagnosticar a presença de problemas emocionais, era necessário um mínimo de dois indicadores. As crianças da amostra clínica obtiveram média maior de indicadores (1.82 para o Homem e 2.01 para a Mulher), e só atingiram os dois pontos estabelecidos por Koppitz no desenho da Mulher, enquanto os escolares tiveram em média 1.2 para as duas figuras.

Tabela 3
Médias, desvios padrão e testes t dos Indicadores Emocionais de Koppitz entre grupo clínico e controle
Médias, desvios padrão e
testes t dos Indicadores Emocionais de Koppitz entre
grupo clínico e controle


A tabela 4 mostra as correlações entre os IMS e os IES para cada desenho, em cada grupo. Pode-se verificar que as correlações são muito próximas, mostrando a existência de uma relação entre os dois tipos de indicadores.

Tabela 4
Correlações entre IM e IE controlando a idade, entre grupo clínico e grupo controle e significância (p)
 Correlações
entre IM e IE controlando a idade, entre grupo clínico e grupo controle e significância
(p)


A fim de investigar melhor a influência das dificuldades escolares (uma das queixas mais frequentes junto à população infantil) no desempenho cognitivo e nos aspectos emocionais, foram selecionadas as crianças do grupo clínico que apresentavam especificamente esta queixa (escolar), sendo a amostra assim caracterizada, composta por 22 das 74 crianças da amostra clínica original. Estas foram pareadas com um grupo (N = 22) extraído do grupo controle em função da idade e do tipo de escola, de forma a manter os grupos equivalentes. As comparações entre os grupos nos IMS de Koppitz são apresentadas na tabela 5.

Tabela 5
Médias, desvios padrão e testes t dos Indicadores Maturacionais de Koppitz entre grupo clínico e controle
Médias, desvios padrão e testes t dos Indicadores Maturacionais de Koppitz entre
grupo clínico e controle


Os resultados da tabela 5 indicam que existem diferenças significantes (p = 0.05) dos IMS de Koppitz entre as crianças com e sem dificuldades escolares, sendo que o grupo clínico apresenta médias menores nos dois desenhos, como ocorreu com a amostra clínica original.

Tabela 6
Médias, desvios padrão e testes t dos Indicadores Emocionais de Koppitz entre crianças com e sem dificuldades escolares
Médias, desvios padrão e testes t dos Indicadores
Emocionais de Koppitz entre crianças com e sem dificuldades
escolares


Na tabela 6 é apresentada a comparação dos IES entre os grupos. Esta Tabela indica a existência de diferenças significantes (p <0.001) tanto para o desenho do Homem (p < 0.001) quanto para o da Mulher, entre crianças com e sem dificuldades emocionais.

Discussão

Os resultados obtidos nessa pesquisa indicam que as crianças do grupo clínico têm mais prejuízos no desenvolvimento cognitivo, confirmando os dados da literatura. A tabela 4 aponta que os IMS são afetados pelos IES, o que está de acordo com os resultados de Wechsler, Prado, Oliveira e Mazzarino (2011), em que a pontuação emocional também se correlacionou negativamente com a cognitiva, o que sugere que as dificuldades emocionais (pontos atribuídos à presença de Indicadores Emocionais) podem trazer prejuízos no desempenho das crianças ou, ainda, dificuldades cognitivas podem trazer comprometimentos emocionais. Contudo, Özer (2010), na Turquia, não encontrou dados confirmando a validade dos Indicadores Emocionais na avaliação de crianças de clínica psicológica de uma universidade pública, diferindo dos resultados desta pesquisa e sugerindo, assim, necessidade de outras investigações, inclusive com grupos clínicos diferenciados.

Koppitz (1973) já havia indicado como ponto de corte a presença de dois IES. Os resultados apresentados na Tabela 3 sugerem a confirmação da autora, de que os IES são sensíveis para diferenciar as duas amostras (clínica e controle), constituindo evidência da validade dos IES de Koppitz para o diagnóstico de problemas emocionais em crianças, ao menos na faixa etária estudada.

Pelo fato de as dificuldades de aprendizagem ser, ao menos no Brasil, uma das queixas mais frequentes no que se refere a problemas junto às crianças em fase de escolaridade, foi feito o estudo com a parcela da amostra clínica original que apresentou esta queixa como motivo de encaminhamento aos serviços de Psicologia. A partir desses resultados, pode-se levantar a hipótese de que as dificuldades escolares demonstradas por crianças de 6 a 11 anos não estão relacionadas a atrasos maturacionais ou desenvolvimentais, mas sim a problemas emocionais. Apesar de a amostra ser pequena (N = 22), os resultados mostram uma diferença muito grande entre as crianças com e sem dificuldades escolares nos IES. Pode ser constatado que para o Desenho do Homem, as crianças tiveram uma média de 2 pontos, que é considerada como limite para se considerar problemas emocionais. Contudo, no Desenho da Mulher, a média de indicadores foi 1.5, ainda sendo significante a diferença, o que pode mostrar que este desenho foi menos sensível para a avaliação dos IES. Esse resultado difere do apresentado na tabela 3, em que a diferença de 2 pontos entre as médias ocorreu no Desenho da Mulher, enquanto no Desenho do Homem, a diferença foi 1.82, valor próximo ao apresentado por Koppitz (1973).

Cariola (2006) também encontrou, entre as crianças com bruxismo, a presença de dois ou mais indicadores, porém a solicitação usada por essa autora foi para desenhar uma pessoa, o que pode levar à suposição de que, quando se pede duas figuras, a masculina e a feminina, uma dessas figuras pode ser mais neutra para a criança, e a problemática emocional pode aparecer em apenas uma das figuras. Assim, a influência tanto do sexo da figura desenhada quanto do sexo do desenhista deve ser melhor investigada para oferecer generalizações mais amplas.

Na pesquisa de Kobayashi (2015), após o estabelecimento do critério de considerar como indicadores os itens que tivessem frequência menor do que 16% na amostra, seus resultados mostraram que a presença de apenas um indicador ocorreu em 36% da amostra, dois indicadores em 15.6%, três indicadores em 4.7%, quatro em 1.6% e cinco em 0.5%.

No estudo de Hutz e Antoniazzi (1995) relativo à amostra normativa, o total de 2 IES somente corresponde ao percentil 20 para 14 anos, de 3 IES ao percentil 15 para 12 e 13 anos, de 5 pontos ao percentil 15 aos 9 anos, de 6 IES ao percentil 20 aos 6 anos e 7 pontos ao percentil 20 aos 5 anos. O máximo de IES presente na tabela foi de 10 pon-tos, levando-se em conta que eles não fizeram a correção do total de indicadores com frequência menor de 16% para elaborar esta tabela.

Para determinar quais indicadores apresentaram diferenças significantes entre a amostra clínica e a de controle, foram calculados os qui-quadrados para cada IE para cada figura. Os itens que mostraram diferenças significantes entre os grupos foram: para o desenho do Homem, o item 3 [χ² (1, N = 148) = 11.88, p < 0.001]; para o desenho da Mulher, os itens 29 [χ² (1, N = 148) = 3.86, p =0.05], e o item 30 [χ² (1, N = 148) = 5.54, p = 0.02]. O item 3 se refere ao sombreado do corpo e das extremidades, o 29 se refere à omissão dos pés e o 30 à omissão do pescoço. O item 3 teve, na amostra de Hutz e Antoniazzi (1995), frequência menor do que 16% a partir 6 anos, o 29 a partir de 8 anos e o Item 30, a partir de 11 anos. Na pesquisa de Kobayashi (2015), o item 3 teve frequência menor do que 5,31% em todas as faixas etárias, o 29 teve frequência menor do que 16% apenas para os meninos a partir de 6 e de 7 anos para as meninas. Já o item 30, a partir de 9 anos para as meninas e de 10 anos para os meninos, lembrando que, para essa pesquisa, foi solicitado o desenho de um Homem e não de uma Pessoa.

Considerações finais

O Desenho da Figura Humana mostrou-se um bom instrumento para avaliação psicológica infantil, tanto no que se refere à avaliação do desenvolvimento quanto com relação aos IES propostos por Koppitz. As crianças do grupo clínico apresentaram uma diferença significante no total de pontos em relação ao grupo controle, nas duas figuras desenhadas. Estes pontos apresentaram correlação negativa também significante, ainda que moderada, com os IMS de Koppitz, ainda controlando a idade como covariável, indicando que as dificuldades emocionais parecem afetar o desempenho das crianças, em conformidade com os resultados de Wechsler, Prado, Oliveira e Mazzarino (2011). Assim, os IES se mostraram sensíveis para diferenciar as duas amostras.

Conclui-se que os IES foram sensíveis para diferenciar o grupo controle da amostra clínica. Esta pesquisa contribuiu, desta maneira, com a validade do teste, acrescentando maior segurança à avaliação psicológica infantil. Para maiores generalizações, serão necessários estudos com amostras mais amplas; amostras clínicas diferenciadas em função das queixas apresentadas e/ou dos diagnósticos; bem como estudos correlacionais com outros indicadores de dificuldades emocionais infantis.

Referências

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Notas

1 Originalmente publicado no 1968.

* Resultados preliminares desta pequisa foram publicados em Anais do 4th International Congress of Educational Sciences and Development, 2016.

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