Cibervitimização e suporte social percebido pelos adolescentes e jovens adultos

Cibervictimización y apoyo social percibido por adolescentes y adultos jóvenes

Cybervictimization and Social Support Perceived by Adolescents and Young Adults

Flávia Cabral *
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Portugal
Otília M. Fernandes
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Portugal
Inês C. Relva
Universidade do Porto, Portugal

Cibervitimização e suporte social percebido pelos adolescentes e jovens adultos

Avances en Psicología Latinoamericana, vol. 40, núm. 3, 2022

Universidad del Rosario

Recepção: 24 Fevereiro 2022

Aprovação: 25 Outubro 2022

Informação adicional

Para citar este artigo: Cabral, F., Fernandes, O. M., & Relva, I. C. (2022). Cibervitimização e suporte social percebido pelos adolescentes e jovens adultos. Avances en Psicología Latinoamericana, 40(3), 1-16. https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.10914

Resumo: O presente estudo teve como objetivo analisar a relação entre a cibervitimização (Cybervictimization Questionnaire, CYVIC) e a satisfação com o suporte social (Escala de Satisfação com o Suporte Social, ESSS). A amostra foi constituída por 346 participantes divididos em dois grupos: adolescentes (15-19 anos) e jovens adultos (2030 anos). Verificaram-se associações negativas entre a satisfação com o suporte social e a cibervitimização. Os resultados sugerem diferenças a nível de idade para as duas variáveis dependentes, com os adolescentes apresentando maior satisfação com a família do que os jovens adultos, e estes últimos uma maior satisfação com as atividades sociais do que os adolescentes, e, finalmente, os participantes mais novos estão mais envolvidos na cibervitimização do que os mais velhos. Por fim, observou-se um papel preditor da satisfação com as atividades sociais sobre a cibervitimização. Assim, este estudo contribui para colmatar a escassa literatura existente em Portugal acerca da relação entre o ciberbullying e o suporte social, salientando a importância das relações sociais e, especialmente, do envolvimento em atividades de caráter social, mostrando uma clara necessidade de integrar os jovens na comunidade e na sociedade, dando-lhes a oportunidade de se envolverem em atividades e relações satisfatórias como forma de prevenção de comportamentos desajustados como é o caso do ciberbullying.

Palavras-chave: cibervitimização, suporte social, adolescentes, jovens adultos.

Abstract: The present study aimed to analyse the relationship between cybervictimization (measured trough the Cybervictimization Questionnaire, CYVIC) and satisfaction with social support (Escala de Satisfação com o Suporte Social, ESSS). The sample consisted of 346 participants divided into two groups: adolescents (1519 years) and young adults (20-30years). There were negative associations between satisfaction with social support and cybervictimization. The results also suggest differences in terms of age for the two dependent variables, with adolescents showing greater satisfaction with the family than young adults and these being more satisfied with social activities than adolescents, and the younger participants being more involved in cybervictimization than the older ones. Finally, there was a predictive role of satisfaction with social activities on cybervictimization. Thus, this study contributes to the little Brazilian literature about the relationship between cyberbullying and social support, highlighting the importance of social relationships and, especially, involvement in social activities; there is a clear need to integrate young people into the community and society and give them the opportunity to engage in satisfactory activities and relationships as a way of preventing maladjusted behaviour, such as cyberbullying.

Keywords: Cybervictimization, social support, adolescents, young adults.

Resumen: El presente estudio tuvo como objetivo analizar la relación entre la cibervictimización (Cuestionario de Cibervictimización, CYVIC) y la satisfacción con el apoyo social (Escala de Satisfação com o Suporte Social, ESSS). La muestra estuvo compuesta por 346 participantes divididos en dos grupos: adolescentes (15-19 años) y adultos jóvenes (20-30 años). Se encontraron asociaciones negativas entre la satisfacción con el apoyo social y la cibervictimización. Los resultados sugieren diferencias de edad para las dos variables dependientes, mostrando que los adolescentes tienen una mayor satisfactión con su familia que los adultos jóvenes, y estos últimos, muestran una mayor satisfacción con las actividades sociales que los adolescentes, para terminar, los participantes más jóvenes se involucran más en la cibervictimización que los mayores. Finalmente, se observó un papel predictor de la satisfacción con las actividades sociales sobre la cibervictimización. Así, este estudio contribuye a llenar la escasa literatura que existe en Portugal sobre la relación entre ciberacoso y apoyo social, enfatizando la importancia de las relaciones sociales, mostrando una clara necesidad de integrar a los jóvenes en la comunidad y la sociedad, brindándoles la oportunidad de participar en actividades y relaciones satisfactorias como una forma de prevenir comportamientos desadaptativos como el ciberacoso.

Palabras clave: cibervictimización, apoyo social, adolescentes, jóvenes adultos.

O ser humano manifesta uma necessidade do outro, transversal a qualquer idade. Uma necessidade inerente de afeto e amor, de valorização, cuidado, amor ou compreensão, de segurança e suporte (Almeida & Caldas, 2012), sendo que muitos consideram as relações afetivas como uma dimensão crucial nas suas vidas (Almeida & Caldas, 2012). Estas necessidades, se satisfeitas, possibilitam um desenvolvimento identitário e psicossocial seguros e ajustados, base para a procura de outras relações também elas saudáveis e com vínculos adaptativos (Almeida & Caldas, 2012).

Assim, surge o conceito de suporte social, um conceito multidimensional (Farnia et al., 2018), que pode ser definido, segundo Campos (2004), como interações sociais com o objetivo de promover o bem-estar como resultado dessas mesmas interações, isto é, não basta estar inserido num grupo ou numa rede social, é necessário que as interações que dessa rede resultem proporcionem e propiciem bem-estar e uma perceção de apoio e proteção ao indivíduo. Já o suporte social percebido é definido como a perceção que um indivíduo possui de que é cuidado, apreciado e amado, bem como parte de uma rede social de pessoas significativas com quem pode contar se desse apoio necessitar, produzindo um sentimento de conexão e pertença (Suorsa et al., 2016). Ou seja, para além do apoio e suporte social por si só, e talvez mais importante do que este, é a perceção de que, de facto, se recebe esse apoio (Antunes & Fontaine, 1995).

O suporte social engloba várias dimensões, como a familiar, de amigos ou outros significativos (Ho et al., 2020). Para além destes, para Ribeiro (1999), autor da escala portuguesa de satisfação com o suporte social, devem também ser tidas em conta a intimidade e as atividades sociais como dimensões a valorizar no estudo do suporte social.

Quanto ao suporte familiar, se a pessoa que o recebe, o perceber e o indivíduo se sentir valorizado, amado, compreendido, considerando este apoio como satisfatório, terá recursos e perceber-se-á como mais capaz de enfrentar situações hostis, culminando num conjunto de consequências positivas para o seu bem-estar (Campos, 2004). Por outro lado, quando os adolescentes e os jovens adultos percebem o suporte social como baixo, este pode acarretar efeitos menos positivos na vida dos adolescentes, como sintomatologia depressiva ou envolvimento em comportamentos antissociais (Ritakallio et al., 2010). De facto, a família é uma fonte de suporte fundamental para o desenvolvimento do indivíduo, conduzindo-o pela aprendizagem da socialização desde a infância até à idade adulta (Martins & Bonito, 2015).

Já o suporte por parte dos amigos inclui relações de amizade com qualidade, de forma a fortalecer e promover no adolescente a resiliência e o ajustamento adaptativo (Hodges et al., 1999; Waldrip et al., 2008). As relações de amizade podem ser um lugar de experimentação das competências sociais e um lugar seguro de suporte emocional para um desenvolvimento saudável de um autoconceito e autoestima positivos (Hodges et al., 1999). O suporte por parte dos pares parece, efetivamente, ir “ganhando terreno” à medida que as crianças se tornam adolescentes e, posteriormente, jovens adultos. Para além da família, o desenvolvimento e a construção da identidade dos adolescentes e jovens adultos, vai recorrendo cada vez mais ao apoio dos pares, verificando-se uma maior interação social com esta dimensão (Sérgio, 2006).

No que concerne à intimidade, esta pode ser considerada como um fator preditor de adaptação psicossocial e emocional na idade adulta (Almeida & Caldas, 2012). Ou seja, relações de proximidade em que existe partilha daquilo que é mais pessoal em cada um de nós, traduz-se num conjunto de sentimentos positivos e de bem-estar tanto em relação ao próprio como ao outro e, quando esta relação é percebida e adquire um significado, precisamente, de que é uma relação recíproca e positiva, poderá, então, funcionar como um fator protetor e de adaptação contra as adversidades e vicissitudes da vida (Almeida & Caldas, 2012).

No que toca ao papel das atividades sociais e ao uso do tempo livre de forma que se perceba satisfatória, pode dizer-se que criam, para os jovens, um espaço de desenvolvimento pessoal com a descoberta da criatividade e individualidade, de criação e expansão de expectativas e de integração social, até pelo papel da escolha, isto é, optar por determinadas atividades e não outras (Sarriera et al., 2007). Apesar de não existirem estudos que se debrucem sobre a relação entre o envolvimento em atividades (sociais) e o ciberbullying e, especificamente, a cibervitimização, Sarriera et al. (2007) relatam que, ao não terem perceção de que tenham alguma atividade em que participar ou desenvolver, os jovens poderão envolver-se, no seu tempo livre, em comportamentos que acarretem algum tipo de risco não só físico, mas também emocional. Isto pode ser explicado recorrendo à Teoria do Displacement (ou do deslocamento) (Lee, 2009). Segundo esta teoria o tempo que é gasto numa determinada atividade interfere no tempo que deveria ser dedicado a uma outra. E alguns estudos mostram que a utilização cada vez mais frequente da Internet parece estar, de facto, a interferir com o tempo que seria gasto em atividades de interação social (Mesch, 2003).

Atualmente, devido à cada vez maior disseminação das tecnologias, uma nova forma de bullying tem ganho terreno e fenómenos sociais que se verificavam apenas off-line, começaram também a verificarse on-line, como é o caso da transição bullying tradicional-ciberbullying (Zhou et al., 2013).

Efetivamente, existem algumas evidências, ainda que escassas, de que poucas, inadequadas e insatisfatórias relações off-line, podem estar relacionadas com a vitimização por ciberbullying dos adolescentes (Hoff & Mitchell, 2009) e que, de facto, atualmente, os jovens podem seguir caminhos que os desviam das redes e relações cognitivo-afetivas tradicionais para redes e percursos que privilegiam a tecnologia (Almeida & Caldas, 2012). Algumas investigações sugerem que pode haver uma associação negativa entre o suporte social e o uso da Internet (incluindo a frequência de utilização). Por exemplo, Mesch (2003) verificou que o uso da Internet estava negativamente associado à proximidade dos adolescentes com as suas famílias e positivamente associado a conflitos familiares. Ou seja, o uso da Internet parece interferir nas relações mais próximas e íntimas, como é o caso das relações familiares (Lee, 2009). A maioria dos autores definem ciberbullying como um ato ou comportamento agressivo, intencional e repetido, perpetrado por um indivíduo, utilizando as tecnologias para o efeito (Von Marées & Petermann, 2012), ato esse prejudicial para a reputação/ imagem de uma vítima que terá dificuldade em se defender, independentemente das estratégias de coping que utilizar para o fazer (Tokunaga, 2010).

Estudos anteriores têm demonstrado que o suporte social ajuda os jovens a combater o ciberbullying (Demaray & Malecki, 2002; Haynie et al., 2001; Wang et al., 2009). Para além disto, o suporte parental pode funcionar como fator protetor em relação ao envolvimento dos jovens na cibervitimização (Haynie et al., 2001; Wang et al., 2009) e na participação em comportamentos de ciberbullying (Shetgiri et al., 2012). Tal como acontece com o suporte parental e familiar, também um bom e percebido suporte por parte dos amigos, isto é, se os jovens tiverem amizades positivas, também este poderá ser um fator de minimização de risco de ciberbullying (Bollmer et al., 2005). Efetivamente, segundo um estudo realizado em 2020, o suporte social está negativamente associado à vitimização por ciberbullying (Ho et al., 2020), isto é, um maior suporte social percebido pelos jovens está associado a baixos níveis de vitimização.

Assim, este estudo propõe-se a estudar esta nova realidade do ciberbullying, numa população raramente estudada: adolescentes e jovens adultos, associando-a a uma variável que tem sido apontada, como mostra o nosso estado de arte, como fator protetor relativamente ao ciberbullying e, especialmente, à cibervitimização. No entanto, não temos conhecimento de estudos no nosso país que explorem esta associação, pelo que este trabalho se apresenta de maior importância para a comunidade científica e população em geral.

Deste modo, a presente investigação tem como objetivos: (a) explorar a possível associação entre as variáveis em estudo; (b) analisar as diferenças das variáveis dependentes em função da idade e; (c) explorar o efeito preditor do suporte social sobre a cibervitimizacão.

Método

A presente investigação é de caráter quantitativo e transversal, tendo em conta que o objetivo é quantificar fenómenos através de procedimentos estatísticos, tendo as variáveis sido medidas num único momento. É ainda um estudo de caráter correlacional, uma vez que pretende explorar a associação entre as variáveis analisadas (Marôco, 2007).

Participantes

A amostra em estudo é constituída por 346 participantes, que frequentam o ensino secundário de duas escolas do norte do país e o ensino superior (a nível nacional). Os participantes foram selecionados de forma não aleatória (por conveniência). 295 participantes pertencem ao sexo feminino (85.3 %) e 51 ao sexo masculino (14.7 %), com idades compreendidas entre os 15 e os 30 anos (M = 19.42; dP = 2.598). Quanto à escolaridade, 117 participantes encontravam-se a frequentar o ensino secundário (33.8 %), 161 a licenciatura (46.5 %) e 68 o mestrado (19.7 %).

Quanto à utilização da Internet, 67 participantes (19.4 %) utilizam a Internet entre 1 a 3 horas por dia, 112 (32.4 %) entre 3 a 5 horas por dia, 92 (26.6 %) entre 5 a 8 horas por dia e 75 (21.7 %) utilizam a Internet durante mais de 8 horas por dia.

Instrumentos

Para a realização desta investigação, foi aplicado um questionário para a caracterização sociodemográfica dos participantes. Este questionário incluiu questões acerca das seguintes dimensões: sexo, idade, ano de escolaridade e hábitos de uso da Internet, entre outras variáveis.

O Cybervictimization Questionnaire (CYVIC), de Álvarez-García et al. (2017). Este questionário foi criado com o objetivo de avaliar até que ponto o participante é vítima de agressão através do telemóvel ou Internet, e é composto por 19 itens. Os participantes devem indicar a frequência com que foram vítimas dos comportamentos indicados nos últimos três meses, numa escala de tipo Likert de 4 pontos (1= nunca; 2= raramente; 3= frequentemente; 4= sempre). O CYVIC tem 4 fatores principais e 4 indicadores complementares, sendo que, neste estudo, e indo ao encontro dos objetivos, a cibervitimização foi avaliada utilizando a escala completa, ou seja, através da soma da pontuação total de cada participante (mínimo de 19 pontos e máximo de 76), sendo que pontuações mais elevadas corresponderão a maiores níveis de vitimização. Considera-se vítima de ciberbullying, segundo os autores, os participantes que foram alvo de pelo menos um comportamento da escala. A consistência interna obtida pelos autores quando utilizaram a escala completa (Álvarez-García et al., 2019) foi adequada, com um alfa de Cronbach de .79. A versão portuguesa deste questionário foi traduzida por Fernandes e Relva (2019).

No presente estudo o valor de confiabilidade, medido através do alfa de Cronbach foi também adequado (.80). Em relação à análise fatorial confirmatória, o ajustamento dos valores foi confirmado sendo χ2 (12) = 44.431; p = .000; CFI = .96; gFI = .96; e RMseA = .09.

A Escala de Satisfação com o Suporte Social (ESSS) desenvolvida por Ribeiro (1999) mede a satisfação com o suporte social existente. Esta escala é constituída por 15 itens, distribuídos por 4 fatores: (1) satisfação com os amigos, que mede a satisfação com as amizades/amigos que tem, composto por cinco itens (“Os amigos não me procuram tantas vezes quantas eu gostaria”); (2) intimidade, composto por quatro itens, que mede a perceção da existência de suporte social íntimo (“Por vezes sinto-me só no mundo e sem apoio”);

(3) satisfação com a família, que mede a satisfação com o suporte social familiar existente, composto por 3 itens (“Estou satisfeito com a forma como me relaciono com a minha família”); e (4) atividades sociais, composto por três itens e que medem a satisfação com as atividades sociais que realiza (“Sinto falta de atividades sociais que me satisfaçam”). O participante deverá assinalar o grau em que concorda com a afirmação numa escala de Likert com cinco posições (“Concordo totalmente”; “concordo na maior parte”; “não concordo nem discordo”; “discordo na maior parte”; “discordo totalmente”). Relativamente à consistência interna da escala, o . de Cronbach total foi de .85, sendo o valor do fator 1 de .83, do fator 2 e 3 de .74 e do fator 4 de .64. A escala inclui itens invertidos que são os seguintes: 4, 5, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15, pelo que deverá ser atribuído o valor “1” aos itens assinalados com “E” e “5” aos assinalados com “A”. A pontuação da escala pode variar entre 15 e 75 e não apresenta pontos de corte.

No presente estudo os valores de confiabilidade, medidos através do alfa de Cronbach foram maioritariamente adequados. Assim, os valores do alfa foram de .84 para a subescala satisfação com os amigos, .77 para a subescala intimidade, .87 para a subescala satisfação com a família e .68 para a subescala atividades sociais. Em relação à análise fatorial confirmatória, o ajustamento dos valores foi confirmado sendo χ2 (29) = 78.126; p = .000; CFI = .97; gFI = .96 e RMseA = .07.

Procedimentos

Solicitada a autorização para a realização do presente estudo à Comissão de Ética (CE) da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, após o parecer favorável por parte da CE foi realizado um pedido à Direção Geral do Ensino (DGE), através da plataforma MIME, para que o questionário pudesse ser administrado nas escolas. Tendo obtido autorização por parte da DGE foram contactadas duas escolas do norte do país, a fim de obter a autorização das mesmas para colaboração na recolha de dados, tendo sido explicados, às respetivas direções, os objetivos do estudo, os procedimentos de aplicação dos instrumentos e o público-alvo, assegurando e garantindo os procedimentos éticos convencionais, nomeadamente o anonimato, a confidencialidade das respostas e a voluntariedade na participação, não havendo consequências aos alunos que desejassem cessar a participação. Assim, e em coordenação com as direções das respetivas escolas, foram entregues os consentimentos informados que, distribuídos pelos diretores de turma, foram entregues aos encarregados de educação para que estes pudessem dar ou não a sua autorização para que os seus educandos pudessem participar na investigação.

No entanto, este processo não teve continuidade, uma vez que nesta mesma altura (março de 2020), o estado de pandemia devido à COVID-19 obrigou ao encerramento dos estabelecimentos de ensino em Portugal. Desta forma foi necessário recorrer a adaptações e, novamente, foi solicitado um parecer à CE para que a recolha de dados pudesse ser feita on-line e não em formato tradicional (em suporte papel e em sala de aula com a supervisão da investigadora). Um parecer favorável foi obtido e procedeu-se em seguida à construção do questionário on-line através da plataforma Limesurvey.

As escolas anteriormente abordadas foram novamente contactadas para que pudessem ser explicadas as alterações que foram feitas a fim de perturbar o menos possível as atividades letivas que se mantinham presenciais. Desta forma, foi proposto às escolas que divulgassem o link de acesso ao questionário pelos alunos do ensino secundário, sendo mantidas todas as questões éticas anteriormente referidas.

Por outro lado, a situação pandémica tornou cada vez mais difícil a coordenação com as escolas e estas estavam em saturação devido a todos os constrangimentos que uma pandemia acarreta, mas, ainda assim, foi contactada uma nova escola. Porém, não obtendo colaboração e celeridade nas escolas secundárias, optou-se por divulgar a investigação aos estudantes universitários ou estudantes com idade igual ou superior a 18 anos.

Assim, a recolha de dados realizou-se em dois universos: alunos do ensino secundário e superior. A sua participação foi voluntária e anónima, tendo sido os protocolos respondidos pelos participantes de forma individual, com uma duração de cerca de 20 minutos.

Estratégia de análise de dados

Inicialmente procedeu-se à exportação de dados do software LimeSurvey para a aplicação Microsoft Excel. Foram importados apenas os questionários com preenchimento completo. Posteriormente, realizou-se a importação desses dados para o software SPSS (IBM sPss Statistics, versão 23), tendo sido executada a transformação de valores das variáveis de forma a ficarem quantificáveis. Na sequência, as variáveis de cada instrumento em estudo foram categorizadas e criadas as respetivas dimensões pertencentes a cada instrumento, invertendo-se também os itens necessários, segundo os autores originais. Não foi necessário identificar missings na amostra, uma vez que só foram utilizados os questionários completamente preenchidos, tendo em conta que nestes não era possível a submissão sem que todas as questões estivessem respondidas. Foi calculado o grau de consistência interna das variáveis em estudo recorrendo ao alfa de Cronbach com o objetivo de verificar se os instrumentos utilizados eram confiáveis face à amostra recolhida (Marôco, 2014), bem como as respetivas análises confirmatórias de 1ª ordem, através do programa estatístico AMOS na versão 23.0, de forma a verificar se os instrumentos se mostravam adequados e ajustados à amostra em estudo.

Posteriormente a normalidade foi avaliada através dos indicadores assimetria e curtose, tendo este pressuposto sido violado para a variável da cibervitimização (avaliada pelo CYVIC). Assim, recorreu-se ao uso de testes não paramétricos para a realização das análises que envolvessem esta variável.

Deste modo, foram realizadas análises de correlações de Spearman para explorar as possíveis associações entre as variáveis dos dois instrumentos (CYVIC e ESSS), tendo por base os intervalos sugeridos por Cohen (1988), em que correlações com valores entre .10 e .29 são baixas, entre .30 e .49 médias e entre .50 e 1 elevadas. Procedeu-se ainda à realização de análises diferenciais ao nível da cibervitimização em função da idade, utilizando o teste U de Mann-Whitney à realização de análises de variância multivariada MANOVA, de forma a apurar possíveis diferenças na satisfação com o suporte social em função da idade. Para este tipo de análises, os valores de eta quadrado considerados foram os sugeridos por Cohen (1988), em que valores entre .1 e .6 é um efeito baixo, entre .7 e .14 um efeito moderado e acima de .14 um efeito elevado. Por fim, realizou-se uma regressão linear múltipla simples, no sentido de verificar o poder preditor das variáveis independentes (as dimensões do esss) sobre a variável dependente (cyvic).

Resultados

Associação entre a satisfação com o suporte social e a cibervitimização

Analisando as correlações entre o suporte social e a cibervitimização (tabela 1), verificou-se que existe associação entre todas as variáveis à exceção da relação cibervitimização e satisfação com a família. Assim, a cibervitimização correlaciona-se de forma fraca e negativa com a satisfação com os amigos (rs= -.118; p = <.05), a intimidade (rs= -.175; p = <.001) e atividades sociais (rs= -.190; p = <.001).

Análise diferencial da satisfação com o suporte social em função da idade

No sentido de verificar até que ponto a satisfação com o suporte social varia em função da idade, foram criados dois grupos etários —os adolescentes (dos 15 aos 19 anos) e os jovens adultos (dos 20 aos 30 anos)— e realizada uma análise de variância multivariada (MANOVA) (tabela 2). De acordo com os resultados observados, verificou-se a existência de uma diferença estatisticamente significativa entre os adolescentes e os jovens adultos em relação à satisfação com o suporte social, F (4, 341) = 6.99, p <. 001, Lambda de Wilks = .92; ƞ2= .08. Quando os resultados da variável dependente foram considerados independentemente, verificaram-se diferenças a um nível estatisticamente significativo para a satisfação com a família, F (1, 344) = 7.61, p = .006, ƞ2= .02 e para a satisfação com as atividades sociais, F (1, 344) = 7.82, p = .005, ƞ2= .02. A análise dos valores médios indica que os adolescentes mostram uma maior satisfação com a família (M = 3.88; dP =.98) do que os jovens adultos (M = 3.56; dP = 1.12), ao passo que estes, por sua vez, apresentam uma maior satisfação com as atividades sociais (M = 2.89; dP = 1.26) comparativamente com os adolescentes (M = 2.55; dP = 1).

Análise diferencial da cibervitimização em função da idade

Uma vez que a variável relativa à cibervitimização não segue uma distribuição normal, foi realizado um teste não paramétrico (U de Mann-Whitney) para comparar a cibervitimização em função da idade (tabela 3).

O teste U de Mann-Whitney revelou a existência de diferenças significativas, com um tamanho de efeito, r, baixo (Cohen, 1988), na cibervitimização entre o grupo dos adolescentes (Mdn = 20, n = 204) e o grupo dos jovens adultos (Mdn = 19, n = 142), U = 10.310, Z = -3.77, p <. 001, r = .26.

Papel preditor da satisfação com o suporte social na cibervitimização

De forma a verificar o papel preditor da satisfação com o suporte social na cibervitimização, realizou-se uma análise de regressão múltipla, tendo como variável dependente a cibervitimização (tabela 4). As análises de regressão múltipla permitem testar quais as variáveis independentes que melhor contribuem para a previsão da variável dependente (Pallant, 2011). Assim, observa-se que a satisfação com o suporte social apresenta um contributo significativo F (4.341) = 6.994, p < .001, explicando 7.6 % da variância total (R2= .076).

Tabela 1
Associação entre a cibervitimização e a satisfação com o suporte social
Associação entre a cibervitimização e a satisfação com o suporte social

Nota. *p <.05; **p <.01. sA = Satisfação com os amigos; IN = Intimidade; sF = Satisfação com a família; As = Atividades Sociais; Cv=Cibervitimizacão; M = Média; dP = Desvio-padrão.

Tabela 2
Diferença da satisfação com o suporte social em função da idade
Diferença da satisfação com o suporte social em função da idade

Nota. M = Média; dP = Desvio-padrão; IC95 %: = Intervalo de Confiança a 95 %; n.s. = Não significativo.

Tabela 3
Diferença da cibervitimização em função da idade
Diferença da cibervitimização em função da idade

Nota. CYVIC = Cybervictimization Questionnaire; Mdn = Mediana.

Tabela 4
Papel preditor da satisfação com o suporte social sobre a cibervitimização
Papel preditor da satisfação com o suporte social sobre a cibervitimização

Nota. B, SE e β para um nível de significância de p <.01; os negritos representam os valores significativos. Bloco 1Dimensões da satisfação com o suporte social.

Através da análise individual do contributo de cada uma das variáveis independentes, verificou-se que apenas a variável Atividades sociais (β = -.707) contribuiu de forma estatisticamente significativa e negativa (p < .001) para o modelo, enquanto preditora da cibervitimização.

Discussão

O presente estudo foi desenvolvido tendo por objetivo geral explorar a possível associação entre as duas variáveis dependentes em estudo: a satisfação com o suporte social e o ciberbullying (cibervitimização). De forma mais específica, pretendeu-se apurar as possíveis diferenças face ao suporte social e à cibervitimização relativamente à idade. Para além disto, objetivava-se, também, explorar o possível papel preditor do suporte social sobre a cibervitimização.

No presente estudo verificou-se associação entre a cibervitimização e as dimensões do suporte social relativas à satisfação com os amigos, intimidade e atividades sociais, ainda que baixas. Estas associações negativas, ou seja, uma maior satisfação com o suporte social, nomeadamente, suporte dos amigos, satisfação com as relações de intimidade e com as atividades sociais parecem associar-se a menor cibervitimização, indo ao encontro do verificado por outros estudos (Ho et al., 2020; Williams & Guerra, 2007). Segundo Navarro et al. (2013), as vítimas de ciberbullying parecem ser mais tímidas e socialmente mais ansiosas, demonstrando pobres relações interpessoais. Assim, estes jovens poderão envolver-se no mundo on-line para criar novas relações, experienciar uma maior autorrevelação e, no fundo, para compensar as dificuldades e a falta de competências sociais que sentem e demonstram na interação social no mundo off-line (Lee, 2009). Apesar de não existirem estudos, no nosso conhecimento, que examinem diretamente esta relação, segundo Lee (2009) e Mesch (2003), o uso da Internet associa-se negativamente a relações próximas e íntimas, por exemplo, dentro da família.

Também a satisfação com a intimidade apresentou associação negativa com a cibervitimização. A intimidade está intimamente ligada ao conceito de proximidade, envolvendo a partilha daquilo que nos é mais pessoal, sendo que uma boa intimidade contribui para uma maior adaptação psicossocial e a um fortalecimento da saúde mental nos adultos (Almeida & Caldas, 2012).

Destas associações (entre a cibervitimização e as dimensões referentes à satisfação com o suporte social), a mais forte está entre a cibervitimização e a satisfação com as atividades sociais. O envolvimento em atividades sociais parece estar associado ao aumento do sentido de bem-estar (Everard et al., 2000), que, juntamente com relações sociais satisfatórias, dão sentido à vida (Resende et al., 2006). Assim, o envolvimento em atividades sociais e o facto de estar satisfeito com estas poderá proteger os jovens de se envolverem em comportamentos desajustados ou desadaptativos. Isto pode acontecer porque, segundo Sarriera et al. (2007), a perceção dos jovens de que não têm atividades com as quais se envolver poderá fazer com que usem o seu tempo livre comprometendo-se em comportamentos que, de alguma forma, impliquem riscos físicos e emocionais. Isto pode ser explicado, por outras palavras, recorrendo à Teoria do Displacement (ou do deslocamento) (Lee, 2009). Adaptando esta teoria à investigação realizada, e tendo em conta que cada vez mais o tempo livre é limitado, o tempo que é gasto numa determinada atividade interfere no tempo que deveria ser dedicado a uma outra. Segundo alguns estudos a utilização cada vez mais frequente da Internet pode estar a interferir com o tempo que seria gasto em atividades de interação social (Mesch, 2003).

Por outro lado, não se verificou associação entre a cibervitimização e a satisfação com a família, o que contraria o estudo de Fanti et al. (2012), em que o suporte social por parte da família, bem como a perceção deste suporte, foi o único fator protetor contra a cibervitimização em adolescentes. Em contrapartida, Pabian (2019) verificou que a procura de suporte social estava associada a baixos níveis de ciberbullying, mas apenas para a procura de suporte dos amigos e não dos pais. Ora, à medida que o tempo passa, as pessoas tendem a apoiar-se no suporte social de forma diferente e de fontes diferentes. Se por um lado, na infância os pais são a fonte de suporte mais importante, na adolescência os amigos começam a ter um papel mais relevante neste suporte (Handono et al., 2019). Outros estudos têm demonstrado que os adolescentes têm uma preferência pela procura de suporte por parte dos pares (Agatston et al., 2007; Dooley et al., 2010), talvez por existir uma perceção de que a ajuda dos pares e amigos é mais eficaz e apropriada do que a dos familiares (Price & Dalgleish, 2010).

A investigação tem demonstrado que o suporte social e as suas dimensões/componentes pode variar e ter diferente impacto em função do grupo etário e tende a haver consenso geral que o domínio de suporte social é multidimensional e que aspetos diferentes de suporte social têm impacto diferente nos indivíduos ou grupos (Ribeiro, 2011) e que os relacionamentos sociais têm pesos diferentes de acordo com as diferentes épocas e fases de vida das pessoas (Resende et al., 2006). No presente estudo, os adolescentes apresentaram uma maior satisfação com a família do que os jovens adultos. Este resultado vai ao encontro do estudo de Vilhjalmsson (1994), onde se verificou que, efetivamente, a família e principalmente os pais constituíam a principal fonte de suporte para os adolescentes. Por sua vez, os jovens adultos apresentam uma maior satisfação com as atividades sociais do que os mais novos. A literatura é escassa em torno desta questão, pelo que podemos levantar a hipótese de que devido ao facto de serem estudantes do ensino superior, os jovens adultos poderão ter maior autonomia e liberdade para escolherem e se envolverem em diversas atividades sociais, muitas vezes sem serem alvo de supervisão e monitorização parental, o que poderá explicar a sua maior satisfação com as atividades sociais comparativamente aos adolescentes. Tal como refere Sarriera et al. (2007), à medida que a faixa etária aumenta, existe uma maior possibilidade de autonomia e liberdade de escolha no que diz respeito às atividades.

Quanto à relação entre a cibervitimização e a idade, os resultados permitem afirmar haver uma diferença na cibervitimização, considerando a idade dos participantes, com um valor de mediana mais elevado no grupo dos mais jovens. De facto, os resultados da literatura acerca desta associação não são claros, sendo que, para além disto, a grande maioria das investigações centram-se na faixa dos 12 aos 17 anos, o que, segundo Li (2006) é uma grave limitação e, neste caso, não nos permite comparar resultados de forma precisa. Ainda assim, sabe-se que o ciberbullying não é restrito a determinada idade ou faixa etária, podendo surgir tanto no ensino básico e secundário, como no ensino superior (Tokunaga, 2010). Balakrishnan (2015) realizou um estudo cuja idade dos participantes variava entre os 17 e os 35 anos e, à semelhança da presente investigação, também os participantes mais velhos apresentaram menos incidentes de ciberbullying. O mesmo autor explica esta conclusão baseado no facto de que, por serem estudantes mais maduros e mais empenhados na concretização dos seus objetivos acadêmicos, poderá, então, haver uma diminuição da tendência no envolvimento de comportamentos de ciberbullying.

Por fim, verificou-se que existe um papel preditor das atividades sociais sobre a cibervitimização. Ou seja, verificou-se uma predição negativa da satisfação com as atividades sociais sobre a cibervitimização. Efetivamente, são escassos os estudos que avaliam esta relação e os que existem centram-se em faixas etárias que não a nossa. Ainda assim, Keresztes et al. (2008) referem que o envolvimento em atividades relacionadas com os pares durante a adolescência afeta os comportamentos dos adolescentes e o seu bem-estar psicológico. Em outras palavras, estar envolvido em atividades com os amigos ou colegas pode funcionar como fator protetor para o bem-estar psicológico dos adolescentes, do mesmo modo que a ausência ou o reduzido envolvimento em atividades sociais pode aumentar a probabilidade de envolvimento em comportamentos desajustados, como é o caso do ciberbullying. No entanto, é uma conclusão a explorar, uma vez que ainda não existem estudos que explorem o papel da satisfação com as atividades sociais e o ciberbullying.

Implicações práticas, limitações e sugestões para estudos futuros

Em primeiro lugar, este estudo contribui para a pouca literatura que existe no nosso país acerca do ciberbullying em relação com o suporte social. As conclusões do presente estudo são pioneiras, especialmente no nosso país, onde os estudos relativos a esta relação são muito raros e maioritariamente realizados no âmbito académico. No entanto, esta escassez é compreensível, tendo em conta o caráter recente do fenómeno denominado ciberbullying (Dooley et al., 2010). Segundo, este trabalho examina estas variáveis numa faixa etária raramente estudada. A grande maioria dos estudos nesta área dedicam-se a crianças e ao início da adolescência (Li, 2006).

Este estudo salientou a importância das relações sociais e, especialmente, do envolvimento em atividades de caráter social como forma de proteção, possivelmente através do desenvolvimento de competências psicossociais, podendo funcionar como fator protetor contra a cibervitimização. Para além disto, os adolescentes parecem ter uma maior probabilidade de ser vítima de ciberbullying do que os jovens adultos. Esta conclusão deverá alertar para que mais trabalhos deste tipo sejam desenvolvidos nas escolas em coordenação com todos os intervenientes que poderão ter um papel no combate a este fenómeno, nomeadamente as próprias escolas, mas também as famílias, pares e /ou outras instituições que possam oferecer atividades extracurriculares que permitam aos jovens sentirem-se envolvidos e integrados na sociedade, pois, tal como foi possível perceber, a rede social pode ser um fator com um peso considerável na proteção e, especialmente, na prevenção dos riscos on-line. Ainda assim, tendo em conta a baixa força das associações analisadas, recomenda-se a continuação do investimento investigativo nesta área para que melhor se possa compreender e, consequentemente, intervir (preferencialmente a um nível preventivo). Ou seja, deve ser feito um trabalho multi e interdisciplinar, com variados agentes e vertentes para que seja dada a oportunidade aos adolescentes e aos jovens adultos para que se sintam integrados na sua comunidade e na sociedade, para que se sintam apoiados pela sua rede social formal e informal, de forma a permitir o desenvolvimento de competências psicossociais indispensáveis a um desenvolvimento identitário saudável, bem como permitir que, no caso de se ser vítima de tais comportamentos, os nossos adolescentes e jovens adultos saibam lidar com eles ou recorrer a quem melhor os poderá ajudar. Aqui apresenta-se o suporte social e a satisfação com o mesmo como um fator de proteção relacionado com a cibervitimização. Para Fanti et al. (2012), identificar fatores tanto protetores como de risco é importante para que se possam desenvolver novas intervenções de caráter preventivo.

O presente estudo apresenta, invariavelmente, limitações que poderão, no entanto, abrir caminho para futuras investigações. Uma primeira limitação, refere-se ao facto de os instrumentos serem medidas de autorrelato, o que pode acarretar alguns vieses nas respostas, correspondendo não à verdade dos factos, mas à verdade do participante, para além de que, o fator desejabilidade social poderá também ter tido uma influência nas referidas respostas. Segundo, apenas participaram no estudo estudantes maioritariamente do sexo feminino, pelo que generalizações para jovens da população geral deverão ser feitas cuidadosamente. Terceiro, trata-se de um estudo de caráter transversal e que, portanto, não permite compreender a forma como as variáveis e resultados persistem ao longo do tempo.

Estudos futuros poderão investigar os motivos, as consequências e as ações que poderão ser tomadas de forma a melhor compreender as vítimas de ciberbullying, mas também ajudá-las. Para além de estudos de prevalência do ciberbullying a partir da perspetiva dos jovens, é também importante que se comece a ampliar tais estudos aos contextos em que este ocorre: o contexto escolar (básico, secundário ou superior) e à comunidade, de forma a perceber até que ponto este tema está a ser abordado e a forma como esta abordagem é feita. Segundo Tokunaga (2010), na área do ciberbullying existe um apoio e uma fiabilidade gerais em dados obtidos através de investigações transversais. Assim, sugere-se que sejam realizados estudos longitudinais, como sendo “a única esperança para se fazerem alegações ténues de causalidade ao longo do tempo” (Tokunaga, 2010, p. 285). Seria ainda importante que, sendo este um estudo transversal, no futuro, outras investigações replicassem os resultados aqui obtidos, mas a partir de um desenho longitudinal, precisamente para que se compreenda se estes resultados persistem ao longo do tempo. Deste modo, no futuro deverão ser criadas iniciativas preventivas e interventivas de forma a orientar e informar os adolescentes e os jovens adultos, mas não só estudantes. Futuramente, deverão também ser tidos em conta os jovens pertencentes à população geral, atendendo a que não são apenas os estudantes que utilizam as novas tecnologias. Por outro lado, essa sensibilização para um tema como o ciberbullying (por exemplo, incorporando este tema nos projetos de prevenção e intervenção do bullying escolar que já é desenvolvido na maioria das escolas portuguesas) poderá e deverá iniciar-se no contexto escolar, de forma que os adolescentes se desenvolvam tendo acesso a informações que lhes serão pertinentes para relações interpessoais futuras, nomeadamente, segundo Agatston et al. (2007), que assediar ou importunar colegas ou pares através de mensagens é uma forma de bullying. Segundo os mesmos autores, esta sensibilização deverá ainda incidir nos “espectadores” (bystanders), expondo-se os passos e a importância que estes intervenientes podem ter, tanto em contexto académico como na comunidade.

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Notas

* National funds support the author Inês Relva’s work through the fCT —Portuguese Foundation for Science and Technology under the project the Scientific Employment Stimulus— Institutional Call, CEECINST/00127/2018. Não temos nenhum conflito de interesses conhecido para divulgar.

Autor notes

* Dirigir correspondência à Flávia Cabral. Endereço: Rua de Casais, n.º 160, Gôve, Baião, CEP: 4640-271, Portugal. Correio eletrônico: flaviacabralpsi@gmail.com